CADERNO DE RESUMOS

Sobre redes… e afetos

Início do ano de 2020… O mundo é surpreendido por uma pandemia. É outono, no Brasil, e assim como no restante do mundo, começamos a descortinar o(s) sentido(s) de “isolamento/afastamento social”. De repente, fomos tolhidos da liberdade de ir e vir e trancamo-nos em casa, com medo de um vírus desconhecido.
Os dias se arrastaram, lentamente, e veio o inverno… Outro desafio se impôs: como dar continuidade às nossas pesquisas e às pesquisas de nossos alunos? Não houve como não sucumbirmos às redes do digital, tanto para aliviar o nosso enclausuramento, como para realizar tarefas simples do cotidiano, mas, especialmente, para trabalhar. Passamos a viver sob a baliza/batuta do digital. Reinventamos o(s) sentido(s) de trabalho e nos reinventamos para dar conta das nossas demandas.
A ideia de um evento interinstitucional surgiu como mais uma atividade conjunta dos grupos de pesquisadoras e pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO). O discurso nos uniu há bastante tempo, e os sonhos em comum nos fazem caminhar lado a lado. De fato, 2020 está sendo um ano com um longo “inverno político” que parece não ter mais fim. Fazer pesquisa em Letras e nas Ciências Humanas tem sido uma luta miúda, considerada insignificante por muitos, mas não esmoreceremos: cada um em sua casa, fazendo de seu lar uma trincheira, resistimos! Seguimos orientando, ensinando, produzindo, aprendendo. A brotação também começa miúda e dela se fazem árvores frondosas, das árvores: florestas. Todo pesquisador é um observador, e a natureza nos ensina: prosseguir é resistir!
A Primavera chegou e, ainda na impossibilidade de nos encontrarmos presencialmente, nos (re)unimos pela/em rede, nos dias 23, 24 e 25 de setembro. Foram dias intensos… recebemos convidados ilustres, de outras universidades do Brasil e também do exterior, que abordaram temas relevantes, como os discursos de ódio e a intolerância, os processos de produção de sentidos, a (des)legitimação da violência de todos os tipos, mas, principalmente, refletimos sobre a necessidade de resistirmos a tudo o que nos afeta e incomoda. As manhãs primaveris foram de muita reflexão.
Alunos de Iniciação Científica e de Pós-Graduação (mestrado e doutorado) de três instituições públicas de ensino superior, a saber, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e a Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) apresentaram suas pesquisas, já concluídas ou em andamento. Foi um momento singular em que voltamos o nosso olhar para cada uma delas. Ao final de cada tarde, para além da imensa contribuição teórica, nos demos conta de como a Análise de Discurso nos (re)une e também como nossas pesquisas nos afetam, ainda que tenhamos a ilusão de olharmos para elas apenas do nosso lugar de pesquisadores.
Conforme João Cabral de Mello Neto nos diz “Um galo sozinho não tece uma manhã”, e esse dizer constitui-se como argumento de autoridade para sustentar a importância das parcerias, das relações dentro dos cursos, das Universidades e entre Universidades brasileiras e internacionais. Falemos de nós, trazendo a UFSM, a UFPR e a UNICENTRO. As parcerias, visíveis há bastante tempo, realizam eventos, publicações, organizações de simpósios, bancas conjuntas etc.
Em relação às parcerias, sublinhamos a importância de compartilhar a produção do conhecimento e de produzir em conjunto com vistas a mostrar que os pesquisadores não são grandes nem pequenos, são sujeitos afetados pelo desejo de produzir e de fazer circular o conhecimento. É esse desejo que nos impulsiona a crescer, a resistir e a fazer dos estudos discursivos o que eles já são: espaços de coautorias, de trocas, de partilhas.
Ancorados nesses pressupostos, continuemos “tecendo manhãs” e redes que sustentam a pesquisa e impulsionam o percurso, apesar de alguns percalços que esses tempos nos impõem. Este Caderno de Resumos é o resultado desse encontro, em que a UFSM, a UFPR e a UNICENTRO (entre)tecem manhãs de primavera, não apenas redes de pesquisas. As universidades seguem fortalecendo afetos mútuos, laços… se desvencilhando de nós e amarras, resistindo, tendo esperança e lutando pelo reconhecimento da ciência. Nesse clima, apresentamos os resumos dos trabalhos do evento, em que cada um se propôs a discutir língua, discurso e resistência!
Manoel de Barros nos representa em seus versos, que passamos a reproduzir agora:
“A gente gostava das palavras quando elas perturbavam o sentido normal das ideias.
[…] Ali até santos davam flor nas pedras.
Porque todos estávamos abrigados pelas palavras.
Usávamos todos uma linguagem de primavera.”
(Menino do Mato, de Manoel de Barros)

Primaverou no Sul!
Boa leitura!

Verli Petri
Maria Cleci Venturini
Gesualda de Lourdes dos Santos Rasia
Célia Bassuma Fernandes

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